Pesquisa na ponta dos dedos
Data: 28/01/2008
Fonte: Jornal de Brasília
Basta um clique para um mundo de informações surgir na tela do computador. O acesso à internet proporciona inúmeros recursos de pesquisas sobre os mais diversos assuntos e representa uma importante fonte no auxílio escolar. No entanto, a maneira como essa ferramenta cibernética vem sendo usada por jovens revela pontos preocupantes.Segundo um estudo realizado pela University College London, na Inglaterra, divulgado na última semana, a chamada "geração Google" (que cresceu com o maior site de buscas da internet, criado em 1998) não tem desenvolvido o hábito de leitura e possui pouca capacidade crítica e habilidade analítica para realizar pesquisas na web. As páginas são muito mais vistas do que lidas.
A pesquisa intitulada "Comportamento Informativo do Pesquisador do Futuro" mostrou, ainda, que a impaciência também é outra característica de quem acessa a internet com freqüência. A afirmação não se limita a crianças e adolescentes. De acordo com o relatório, estudantes universitários e até professores conectados às páginas virtuais apresentam os mesmos "sintomas", como estresse e irritabilidade enquanto aguardam por alguma informação ou resultados de algo que buscam.
Reflexo da rapidezPara o sociólogo e antropólogo Antônio Testa, professor e pesquisador em educação digital e cidadania da Universidade de Brasília (UnB), esse tipo de comportamento que começa a surgir com quem tem acesso à internet não é novidade. "Isso é um reflexo esperado, conseqüente da rapidez e da quantidade de informações que a web oferece. As ferramentas e as tecnologias a que se têm acesso estão a cada dia mais interativas. O que está havendo nada mais é do que a formação da cultura digital", diz.Segundo o pesquisador, a relação dos avanços tecnológicos com o tempo é de pressa. "Tudo é muito intenso e instantâneo. Por isso, quando as coisas não funcionam nesse ritmo, o resultado é o estresse e a impaciência. Faz parte do processo", explica.
Questionado sobre a forma que os estudantes têm usado a internet no auxílio de pesquisas, Testa diz não saber avaliar se o método de cruzar informações é bom ou ruim. "Hoje a internet oferece milhares de fontes e informações que podem e devem ser aproveitadas nas pesquisas. O famoso 'copiar e colar' não é novo. Quem garante que os trabalhos que eram feitos com base nos livros também não eram copiados?", indaga. "Portanto, isso vai da capacidade de raciocínio de cada um. Uns vão aproveitar o acervo disponível para realmente pesquisar e aprender, outros não", diz."Hoje a internet oferece milhares de fontes e informações que podem e devem ser aproveitadas nas pesquisas"Antônio Testa, sociólogo e antropólogo
---Cópia deve ser evitada
Os primos Pedro Henrique Miranda, 11 anos, e Vitor Cappola, 10, são um típico exemplo da "geração Google". Os dois costumam passar boa parte do dia na frente do computador. Assim como boa parte dos jovens da sua idade, os jogos e sites de bate-papo são as páginas mais acessadas por eles.
Na hora de cumprir as tarefas da escola, também é no computador que os dois buscam ajuda. Pedro confessa que consulta a internet, mas diz que costuma usar também livros e revistas. "Faço pesquisas na web sim, porque lá tem muita informação. Posso achar pesquisas sobre qualquer coisa. Só que eu não copio. Pesquiso e depois tento escrever com minhas palavras", explica o garoto.
A mãe de Pedro, Denise Alves Miranda, 46 anos, diz que procura auxiliar o filho nas pesquisas escolares. "No mundo de hoje as crianças têm acesso a tudo muito fácil. Então, procuro monitorar e ensiná-lo o jeito correto de estudar com essa ferramenta que hoje é uma realidade", diz.
Já no caso de Vitor, a história é bem diferente da contada pelo primo. "Pesquiso o assunto e copio e colo mesmo", assume sem titubear. "Depois dou uma lida, estudo o que escrevi para saber mais ou menos o assunto caso a professora me pergunte alguma coisa", entrega. Indagado sobre o que ocorreria se a professora descobrisse, ele responde, sem remorso algum: "Vou levar uma bronca e pronto".
-----Elis e Jessica garantem que não deixaram os livros de lado Web não pode substituir livros.
Para a professora do Departamento de Psicologia Escolar da UnB, Diva Maciel, a internet traz informações importantes e representa uma facilidade na hora de pesquisar. No entanto, ela adverte que o recurso deve ser usado de forma adequada. "É uma ferramenta que tem muito a colaborar. Mas não deve comprometer o conhecimento a ponto de os trabalhos se transformarem em simples reproduções da rede".
Manter o hábito das pesquisas em livros e bibliotecas é fundamental. Mas são os pais, a escola e os professores, os maiores responsáveis na orientação dos filhos e alunos. "É preciso dar exemplos, ensinar. Os pais e professores são mediadores no sentido de ensinar como utilizar a internet, aproveitando o que deve ser usado e garantir que o estudo seja realizado com seriedade", ensina.
Aluna do Ensino Fundamental, Elis Calcagno Martins, 10 anos, garante que os livros na estante de casa ajudam bastante na hora de fazer os trabalhos da escola. Estudante do 5º ano do Ensino Fundamental, Elis aprendeu com a mãe, a professora Maria Luiza Cordeiro, 52 anos, a recorrer ao acervo bibliográfico para realizar as pesquisas. "Sempre procuro o que preciso nos livros. Prefiro fazer assim", afirma Elis, que só tira boas notas na escola.
Mas, não é preciso procurar muito. Elis faz parte dos 19% da população brasileira que tem acesso à internet. Junto dos livros, está o computador, moderno e com conexão em banda larga. "Se não encontro o assunto nos livros, procuro na internet", entrega. A amiga Jéssica Teixeira Mota, 10, também cursa o 5º ano. As duas estudam na mesma escola há dois anos e costumam fazer os trabalhos e pesquisas em conjunto. "É mais fácil pesquisar usando a internet, mas a professora diz que não pode. Daí a gente não faz", explica Jéssica.
"Na nossa escola, a maioria prefere copiar tudo da internet, mas eu acho melhor usar os livros", diz.Maria Luiza afirma que a filha sempre costuma ler livros e que parte dos exemplos são ensinados dentro de casa. "É preciso que os pais estejam atentos e eduquem de forma consciente. Quando decidi ter um computador em casa, ensinei a ela a melhor forma de usá-lo. Não permiti que os livros fossem deixados de lado", afirma.