quarta-feira, 1 de dezembro de 2010

A leitura como ferramenta




Autora: Caroline Lanhi.

Fonte: Gazeta de Cuiabá. Data: 29/11/2010

A cada 4 brasileiros, um não faz a menor ideia sobre o papel da leitura e apenas 3 acreditam que esse hábito tem um significado positivo, diz a pesquisa Retrato da Leitura no Brasil, do Instituto Pró-Livro. É para mudar essa realidade que um projeto desenvolvido há 2 anos por alunos de psicologia da Universidade Federal de Mato Grosso (UFMT) vem comprovando que leitura, desde os primeiros anos de vida, não apenas estimula o gosto pelo livro como ajuda os pequenos a interpretar a realidade, superar medos e criar sua identidade. O projeto "Rede de Apoio à Educação Infantil: interfaces com a psicologia, pedagogia e arquitetura" mostra que as crianças respondem muito bem quando colocadas em contato com a literatura, o que reforça os dados de falta incentivo à leitura no país, tanto por parte dos pais quanto dos Governos, pela carência de políticas públicas efetivas. O projeto é executado em 6 creches da Capital, sendo 5 municipais e 1 estadual. Nelas alunos de psicologia da UFMT escolhem uma obra literária que vai nortear os trabalhos da equipe durante um semestre. A obra geralmente tem alguma relação com o nome da instituição e o personagem principal da história se torna o mascote da creche, sobre o qual as crianças realizam diferentes atividades e recontam, elas mesmas, a história.

Exemplo disso é que foi realizado na creche Santa Clara. Lá o projeto se inspira na vida e obra de Maria Clara Machado (teatróloga conhecida por seus livros e peças de teatro infantil). A obra A Viagem de Clarinha foi encenada pelos acadêmicos e a partir dela criou-se a mascote Clarinha, uma boneca do tamanho das crianças, que passa de mão em mão e sobre a qual derivam outras histórias e inúmeras atividades. O público do projeto é formado por crianças com aproximadamente 2 anos que, por causa da curiosidade em conhecer a história, desenvolvem um poder de concentração muito grande. A partir da relação com os personagens da história, a educadora Daniela Barros da Silva Freire Andrade explica que as crianças criam significados, interpretam o que está ao redor delas, aprendem até mesmo a administrar conflitos como o medo do abandono, presente em grande parte delas. O objetivo principal do projeto é criar espaços de narrativa que estimulem os pequenos a criar a própria história com base na leitura.

"Viemos de uma cultura onde que a criança não fala, uma cultura onde não ouvirmos as crianças. Precisamos superar isso e ver que a criança também produz significados e isso se dá a partir da leitura ampliada". A intenção é implantar esse método em outras creches da Capital, mas o desafio ainda maior é fazer com que essa valorização da leitura não fique estagnada somente nas instituições de ensino infantil, mas seja absorvida de modo integral em toda a vida escolar. O que não pode é as escolas colocarem a leitura como obrigação do aluno - fato que infelizmente acontece na maior parte dos casos, lembra a educadora. O ideal é que o jovem continue associando a leitura à produção das suas próprias histórias ou a outros tipos de arte como o cinema, por exemplo, e assim desenvolva por completo o gosto pelos livros.

Inclusão leva as obras até os leitores carentes

Além da falta de incentivo, um dos motivos apontados pela educadora Daniela Freire para a baixa quantidade de leitores no Brasil é a condição socioeconômica. Muitos não compram livros porque simplesmente não possuem dinheiro para isso, pois as contas vêm em primeiro lugar. O produtor cultural Clóvis Resendes Matos percebeu isso há 5 anos, quando trabalhava em uma livraria de Cuiabá, e decidiu fazer diferente. Apostou todas as suas fichas no projeto Inclusão Literária, com o objetivo de levar a literatura a quem não tem condições de pagar. O resultado foi a criação de 3 bibliotecas em comunidades rurais e uma itinerante, esta última com duas utilidades: ponto de leitura e venda de livros usados a um preço acessível.

Desde então, Clóvis atua de modo independente na Capital. Até tentou angariar investimentos, mas não conseguiu o apoio de empresas que poderiam fomentar a ideia. Mesmo sem ajuda, o retorno foi imediato, tanto por parte de doadores de livros quanto daqueles que apreenderam a gostar de ler. O projeto atrai pessoas de todas as idades e mostra que o livro chama a atenção, só faltam oportunidades. Nos últimos meses, Matos também vem estudando uma maneira de estimular o hábito da leitura distribuindo livros nos pontos de ônibus. O projeto ainda está em fase de aperfeiçoamento. A biblioteca itinerante reúne livros que custam de R$ 5 a R$ 10. Ela vai interromper os trabalhos no final de novembro e durante dezembro, mas a partir de janeiro, voltará todos os domingos, ao campus da UFMT próximo ao zoológico.

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