quinta-feira, 26 de fevereiro de 2009

Para onde vão os livros depois da reforma ortográfica?




Qual o destino dos livros depois da reforma ortográfica?
Autora:Anna Carolina Raposo. Data: 20/02/2009
Fonte: Bravo!

Qual o destino dos livros depois da reforma ortográfica?O novo acordo ortográfico dos países lusófonos trouxe, além da unificação da língua escrita, também algumas inquietações a editores e escritores: os livros que não ganharem reedições ficarão datados? Sofrerão desvalorização? O que fazer com os acervos bibliográficos?
Caem tremas, hífens, acentos diferenciais e começam as preocupações de escritores, editores e educadores. Com o novo acordo ortográfico, uma grande quantidade de material editorial terá de ser revisada, substituída, descartada. Alterações que envolvem esforço e investimento. As editoras já prepararam novos exemplares dos livros didáticos e paradidáticos, incluindo os destinados à compra governamental. Mas o mesmo não aconteceu com a literatura adulta, sem cota prevista de vendas. O escritor Fernando Molica preocupa-se com um possível desaparecimento de títulos. Molica tem quatro livros publicados - o último deles, O Ponto da Partida, em 2008, ainda sob a ortografia antiga.
O escritor prevê que, com as novas regras, os livros escritos na grafia antiga tenham uma vida útil de apenas dois anos. "Depois disso, quando o leitor já estiver habituado, a escrita velha vai causar um estranhamento, um desconforto". Ele questiona o que vai acontecer com os que não passam da primeira edição. "Temo uma retirada de catálogo, uma limpeza de estoque, e fico com muito medo da produção contemporânea brasileira sumir. A gente corre o risco de perder conteúdo", explica.
Nas livrariasOs editores não compartilham desse medo. Eles argumentam que o que determina a permanência ou não das obras no mercado é a demanda, e garantem que o sumiço está fora de questão.
"Na verdade, o que comanda a reedição é o interesse do mercado, na medida em que o estoque acaba. O público é quem pede. Não vamos reeditar um livro com uma tiragem mínima de três mil cópias, mas que vendeu 800. Mas também não vamos retirá-lo do mercado", afirma Sérgio França, coordenador editorial da Editora Record.
Ele diz que a reimpressão de uma obra não é condicionada pela reforma, mas pela venda. E, segundo França, o controle sobre o mercado foge, inclusive, da alçada das editoras. "Hoje, o livreiro é quem regula esse mercado. Poucas livrarias mantém estoque. O livreiro tem exposto o que está vendendo, e devolve o que foi adquirido em consignação".
Ele prevê, contudo, uma desvalorização das obras marcadas pelo tempo. "Elas podem acabar entrando em liquidação". No entanto, assegura que não vão desaparecer: "O leitor que quiser um exemplar fora das lojas pode encomendar direto na editora".
Carlo Carrenho, publisher do selo Thomas Nelson Brasil, associada da Ediouro, concorda: "A decisão de reeditar independe da reforma ortográfica. A preocupação com reedições não é grande por que são livros perenes. Mas para os casos especiais, os best-sellers, uma reedição adaptada à nova reforma pode dar, inclusive, um 'novo gás' a um produto que já tem êxito", diz Carrenho.
Revisar obras em sua segunda edição e arcar com esses custos só vale para esses casos especiais, segundo Carrenho. "Mas o livro que não for reimpresso vai continuar onde ele está. Ninguém vai recolher", reitera.
Nas bibliotecasDistanciados das urgências do mercado, os acervos bibliográficos não devem dispensar títulos, mas pensam em como farão para orientar seus leitores. Celina Cattini, vice-diretora do colégio Visconde de Porto Seguro, em São Paulo, afirma que as cinco bibliotecas da escola, que somam mais de 70 mil títulos, estudam como fazer para preservar seu acervo e, ao mesmo tempo, alertar os alunos.
"Os livros didáticos e paradidáticos que adotaremos a partir desse ano já estão atualizados. Mas temos um acervo que inclui enciclopédias, livros antigos que não serão revistos. Esse material é riquíssimo e não será descartado, porque seu valor literário e histórico independe da nova ortografia".
Cattini reconhece ainda algum potencial educativo dos livros que preservarem a antiga grafia: "Temos inclusive livros anteriores à reforma ortográfica de 72. Eles podem ser enriquecedores para uma análise da mudança da língua ao longo do tempo. Mudança não só ortográfica, mas de vocabulário, de noções de formalidade". O desafio, agora, é colocar em prática o alerta aos leitores sem afastá-los dos livros antigos. O que o colégio ainda estuda como fazer.
Uma reforma para quem? Para Fernando Molica, é preciso questionar a pertinência da reforma. Ele critica o fato de ela não refletir as alterações do idioma falado e a aceitação passiva por parte dos brasileiros. "Para que serve essa reforma se ela não unifica o idioma? Estive em Portugal em maio do ano passado. Lá, eles viam a reforma como uma invasão brasileira. A língua é patrimônio. E não estou falando de intelectuais, é do povo. Aqui, não há esse sentido de propriedade do idioma. Houve uma aceitação mais passiva, com menos discussão".
Nem o propósito de criar um idioma único foi atingido, segundo Carlo Carrenho "É um luta inglória. Para manuais técnicos, tudo bem, mas na literatura, há muito mais do que a ortografia. Existem diferenças no vocabulário, e na estrutura gramatical escolhida." Por isso, a expectativa de ampliar-se o mercado com as possibilidades de exportação para os mercados africanos e de Portugal - apontada como uma das grandes vantagens da reformulação -não deve se concretizar.
E você, que destino acredita que terão os livros depois da reforma ortográfica?

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